A Constituição Federal em vigor, em seu art. 102, III, atribuí ao STF competência para “julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição; d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal”; e o art. 105, III, atribuí ao STJ competência para “julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência; b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal”.
Conclui-se assim que o recurso extraordinário presta a dar plena efetividade à aplicação da Constituição Federal, e o recurso especial em dar plena efetividade à aplicação do Direito Federal e sua uniformização.
Contudo, muitas vezes, a decisão recorrida é proferida contrariamente a um princípio jurídico, e neste caso, semelhante com o ocorre com a violação de lei (constitucional ou infraconstitucional), se a violação for à princípio de direito federal caberá recurso especial ao STJ, e se a violação for direta à princípio constitucional, caberá, por sua vez, recurso especial ao STF.
Porém, por vezes a afronta à princípio constitucional se dá por via reflexa, dependente de reexame prévio de normas infraconstitucionais, e, neste caso, ao meu ver, cabível o recurso especial; porém se a alegação de afronta à princípio constitucional for autônoma, de forma direta, cabível recurso extraordinário ao C. STF.
Essa exegese é subjacente ao texto da Súmula 636 do STF que dispõe “Não cabe recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade, quando a sua verificação pressuponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão recorrida.”
Ainda, dispõe a Súmula 126 do C. STJ: “É inadmissível recurso especial, quando o acórdão recorrido assenta em fundamentos constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por si só, para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta recurso extraordinário.”
Assim, o que se extraí é que não havendo questão constitucional autônoma na decisão hostilizada capaz de autorizar a interposição de recurso extraordinário, tendo a ofensa à princípio constitucional se dado por via reflexa ou indireta, atraindo, mutatus mutantis, o enunciado da Sumula 636 do STF, cabível o recurso especial.
Quanto ao mais, o STF já proclamou que “quando se fizer necessário o exame prévio de norma infraconstitucional para verificação de contrariedade ao texto Maior, estará caracterizada ofensa reflexa ou indireta à Carta Magna” (AGRG no Agravo de Instrumento nº 528.750-7/SC, Relator: Min. Joaquim Barboza, DJU de 28/4/2006); “A situação de ofensa meramente reflexa ao texto constitucional, quando ocorrente, não basta, por si só, para viabilizar a via recursal extraordinária. Precedentes” (AI 472294 AgR/RS, Relator: Min. Celso de Mello, DJU de 18/02/2005).
Assim, a ofensa reflexa à princípio constitucional inviabiliza o manejo do recurso extraordinário, uma vez que somente a ofensa direta, frontal à preceito Constitucional autoriza a admissão do referido recurso à Corte Maior.
Para melhor elucidação, a exemplo, podemos destacar: alegação de ofensa ao princípio do devido processo legal (art. 5º, LV da CF), se essa ofensa tivesse havido, seria ela indireta, reflexa, dado que a ofensa direta seria a normas processuais, situadas, pois, no campo infraconstitucional.
Com a devida vênia a entendimento contrário, a meu ver, tendo em vista que o STF tem admitido recurso extraordinário tão somente quando a afronta à Constituição for direta, não admitir-se o recurso especial quanto a violação a princípio constitucional for de forma reflexa, indireta, donde se pressupõe a análise de dispositivo infraconstitucional, estará sendo violado o direito à ampla defesa, ao contraditório e ao duplo grau de jurisdição, o que seria inadmissível. Em meu ponto de vista pessoal, embora não se possa ignorar a crise por que passa o Tribunal Superior de Justiça abarrotado de processo, tal fato não pode fazer com que este venha filtrar e restringir ao máximo a admissibilidade dos recursos, e assim prejudicar os jurisdicionados, principalmente levando-se em consideração a tutela dos princípios processuais consagrados e esculpidos na Constituição Federal, como os acima destacados.
Como visto acima, o STF tem inadmitido recursos extraordinários que versam sobre ofensa indireta ou reflexa a princípios constitucionais, o que, assim, por exclusão, deslocaria logicamente a competência de julgamento para o Superior Tribunal de Justiça, por intermédio de recurso especial.
E conforme já vem entendendo Thiago Luiz Pacheco de Carvalho (http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=14605), "há de ser observado que tal entendimento da Suprema Corte apenas se aplica às hipóteses em que, a pretexto de ofensa a princípios constitucionais, pretende-se a análise de legislação infraconstitucional, o que nos leva a crer que, havendo puramente uma violação a princípio constitucional, sem pretensão de análise de legislação infraconstitucional, caberá sim ao STF a apreciação e julgamento de recursos extraordinários que versem sobre eventual violação a princípio constitucional, ante seu dever de "guardar" a Constituição, pois, tem-se que, quando a Carta Magna determina que caberá recurso extraordinário quando a decisão recorrida contrariar dispositivo da Constituição (artigo 102, III, a), é inegável que, se a decisão recorrida contrariar princípio constitucional, configurado está o pressuposto para o cabimento do recurso extraordinário.
Portanto, é patente não ser admissível recurso especial quando o objetivo for a discussão de eventual violação direta a princípio constitucional, o que apenas será possível mediante interposição de recurso extraordinário junto ao STF, salvo quando o intuito maior do recurso for a análise de legislação infraconstitucional, a pretexto de ofensa a princípios constitucionais, hipótese em que a competência para analisar o caso será do Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso especial."
Assim, diante do que foi exposto, conclui-se que quando a violação a princípio constitucional for direta e frontal, só é possível o exame via recurso extraordinário; e quando a violação a princípio constitucional o for por via oblíqua, reflexa, tendo em vista que neste caso o C. STF não admite o recurso extraordinário, cabível recurso especial ao C. Superior Tribunal de Justiça, posto que se pressupõe a análise de dispositivo infraconstitucional, cuja violação causará ofensa também a princípio constitucional.
BIBLIOGRAFIA:
- BRASIL. Supremo Tribunal Federal. 2ª Turma. Relatora Ministra Ellen Gracie. AI nº 749415/PA. Acórdão publicado no Diário da Justiça de 18/12/09.
- BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. – 1ª Turma. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2008/0137028-3/BA. Relator: Min. Benedito Gonçalves. Brasília/DF, 12 de maio de 2009. DJE 25.05.2009
- BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. – 6ª Turma. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2006/0225683-6/RS. Relator: Min. Paulo Galloti. Brasília/DF, 12 de junho de 2008. DJE 25.08.2008
- NAGIB. Miguel Francisco Urbano. A COMPETÊNCIA RECURSAL EXTRAORDINÁRIA DO SUPREMO E DO STJ. Disponível em: http://www.iobonlinejuridico.com.br. Acesso em: 09.03.2010.
- CALMON. Eliana. O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NA CONSTITUIÇÃO. Disponível em: http://www.iobonlinejuridico.com.br. Acesso em: 09.03.2010.